O processo de escrever é feito de erros – a maioria essenciais – de coragem e preguiça, desespero e esperança, de vegetativa atenção, de sentimento constante (não pensamento) que não conduz a nada e de repente aquilo que se pensou que era ‘nada’ era o próprio assustador contato com a tessitura de viver – e esse instante de reconhecimento (igual a uma revelação) precisa ser recebido com a maior inocência, com a inocência de que se é feito. O processo de escrever é difícil? Mas é como chamar de difícil o modo extremamente e caprichoso e natural como uma flor é feita. (‘Mamãe’, disse-me o menino – ‘o mar está lindo, verde com azul, e com ondas! Está todo anaturezado! Todo sem ninguém ter feito ele!’) A impaciência enorme ao trabalhar (ficar de pé junto da planta para vê-la crescer e não se vê nada) não é em relação à coisa propriamente dita, mas à paciência monstruosa que se tem (a planta cresce de noite). Como se dissesse: ‘não suporto um minuto mais ser tão paciente’, ‘a paciência do relojoeiro me enerva’ etc. O que impacienta mais é a pesada paciência vegetativa, boi servindo ao arado.
(in Jornal do Brasil, 8 de maio de 1999)Uma entrevista com Affonso Romano de Sant’Anna
O Terapia da Palavra estava ainda tomando forma no campo das ideias quando me deparei com um livro chamado Como se Faz Literatura, de Affonso Romano de Sant’Anna. Naquela época, início dos anos 2000, comprar livros com pequenas tiragens não era tão simples como hoje....