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Tom Stoppard confirma presença na próxima FLIP  (Festa Literária Internacional de Paraty) e deu uma entrevista ao Estadão, que reproduzo abaixo. No texto, o escritor nos conta um pouco do seu processo criativo, e de lambuja a programação da FLIP, pra quem quiser conferir. Para ler direto no site do Estadão, clique aqui:

”O diálogo surge de forma natural em minha escrita, é algo instintivo”
Stoppard fala de seu processo de criação e explica por que quase recusou o convite para vir ao Brasil
Ubiratan Brasil

Quando foi convidado para participar da próxima edição da Festa Literária Internacional de Paraty, o dramaturgo e roteirista checo naturalizado inglês Tom Stoppard ameaçou agradecer e dizer não – o desprazer de estar longe de seus livros o faz recusar convites de lugares distantes. ”Mas, cinco minutos depois, pensei: ”Não posso morrer sem nunca ter visitado a América do Sul.”” Foi o suficiente para reconsiderar e confirmar presença, tornando-se o mais ilustre convidado da festa que ocorre em julho (leia abaixo).Aos 70 anos (completa mais um em plena Flip), Stoppard tornou-se famoso pelas histórias inteligentes e engenhosas que criou para cinema, TV, rádio e, principalmente, teatro, sua base natural. Shakespeare Apaixonado, por exemplo, garantiu o Oscar de melhor roteiro que Stoppard dividiu com Marc Norman. O bardo inspirou-lhe ainda a peça Rosencrantz e Guildenstern Estão Mortos, que ele mesmo levou ao cinema. Participou ainda do roteiro de Brazil, dirigido por Terry Gilliam.
Na verdade, são poucos os que conseguem mostrar as rachaduras de uma relação. ”Crio diálogos com facilidade”, contou ele ao Estado, em conversa telefônica na qual confessou já ter pisado uma vez em solo sul-americano. ”Fiz baldeação em Bogotá, em uma viagem para as Ilhas Galápagos. Mas não entra na minha conta.”
 
Um roteirista brasileiro, que também é escritor, Marçal Aquino, disse em uma feira literária (Festival da Mantiqueira) que não considera roteiro de cinema uma peça literária. O que você pensa disso?
Creio que pode ser considerado literatura, embora eu nunca tenha escrito roteiros originais – sempre fiz adaptações de obras ou participei do trabalho de outros. Mas acredito que os bons roteiros podem ser admirados como peça literária. Gosto de cinema, embora existam poucos filmes que eu respeite e adoro. Mas são esses que eu respeito principalmente como escritor.

E quais seriam esses filmes?
Alguns são pequenas jóias e assim não seriam se não partissem de um roteiro admirável: Chinatown, Quanto mais Quente Melhor, Os Suspeitos, LA Confidencial, A Vida dos Outros são alguns exemplos. Escrever roteiro para cinema, na verdade, exige uma habilidade natural e específica, diferente da de quem escreve para teatro. No meu caso, acredito ter mais facilidade para a dramaturgia.

Em uma entrevista, você disse não enfrentar problemas para escrever diálogos. O que considera, então, difícil ao escrever?
Considero a estrutura muito difícil de criar. Diálogo, por alguma razão que não entendo, me vem naturalmente. É interessante: a estrutura é algo que você pode estudar a forma, diferente do diálogo, pois é algo instintivo. E escrever o que uma pessoa diz para a outra é a parte do trabalho que mais me agrada. Sei que é um clichê, mas posso garantir que é verdadeiro dizer que, em alguns momentos, o diálogo surge naturalmente na minha escrita.

E, quando você escreve, as imagens da peça surgem na sua mente, assim como as falas dos personagens?
Sim. As imagens sempre surgem na minha cabeça, mas cuido para não me influenciar demais por elas. Quando era mais jovem, eu me preocupava em detalhar como deveria ser o cenário, a sonoplastia, o trabalho artístico, enfim. Com o tempo, descobri que existem profissionais mais capazes para realizar esse trabalho. Hoje, em minhas peças, coloco apenas algumas pistas para inspirar os artistas.

O processo criativo é dolorido?
Não, eu não diria isso. O que me incomoda é não encontrar um assunto para minhas peças. Neste momento, comecei a escrever uma, mas a anterior foi finalizada dois anos atrás. É deprimente o período entre uma e outra. Afeta meu humor. Mas, no instante em que retomo a rotina, nada mais interessa que a nova peça. E o que sinto não é sofrimento, mas estar sob uma tensão, de evitar perder aquele momento criativo.

Por falar nisso, você escreveu trabalhos para cinema, televisão, rádio, mas sempre voltou para o teatro. Por que?
É uma questão interessante. Quando eu era mais jovem, o teatro inglês tornou-se o foco de muita atenção e isso incentivou muitas carreiras. Eu trabalhava como jornalista e escrevia sobre teatro – não fazia críticas, mas reportagens. Conhecia atores, diretores, era algo muito excitante e ainda continua sendo. Decidi me aventurar por essa carreira pelo prazer da aventura e pelo desafio de criar uma história com capacidade de ser encenada. E hoje minha preferência pelo teatro se justifica pelo motivo de que o dramaturgo tem mais controle sobre sua peça que um roteirista sobre seu roteiro. Com raras exceções, não é novidade que astros de cinema gostem de mudar suas falas durante a filmagem. Na verdade, ontem (segunda-feira), escutei no rádio a entrevista de um roteirista que dizia exatamente isso. Apesar de se preocupar com cada vírgula de seu texto, ele percebia que, tão logo a cena era filmada, os atores mudavam quase tudo. Isso é difícil acontecer no teatro. Pode parecer vaidade, mas os dramaturgos são respeitados e percebidos como parte importante do processo.

Em um trabalho recente, a trilogia The Coast of Utopia, você fez muita pesquisa histórica. É prazeroso esse tipo de trabalho?
Sim, muito. Para ser sincero, especificamente nessa trilogia, eu me obriguei a parar de ler para então começar a escrever, pois o tempo empregado em pesquisa já era grande. Atualmente, busco me ocupar com peças que não exigem investigação, pois estou com uma idade em que não tenho tempo a perder. E uma peça de teatro normalmente não demanda tanto esforço como um romance – se você escrever uma página por dia, terá uma peça finalizada em três meses. Mas eu não tenho uma produção tão constante. Quando disse antes que a estrutura da peça é meu maior desafio, o mais dificultoso, na verdade, é encontrar o tema que desperte minha curiosidade.

E onde você busca esses fatos?
Minha ilusão é encontrá-los em jornais e revistas – sou viciado em imprensa escrita, leio diariamente diversas publicações, as quais vasculho em busca de idéias. Mas, ao final, nem sempre ali é uma boa fonte. Tenho mais sorte em conversas triviais com amigos, pois sempre fui atraído por assuntos abstratos. Gosto de idéias vindas de narrativas. Minha dificuldade é inventar histórias e personagens cujas características se encaixem nas idéias que realmente acredito serem interessantes.

Você colaborou no roteiro do filme Brazil, dirigido por Terry Gilliam. Qual foi sua participação na história?
Criei a maioria dos diálogos. Gilliam escreveu o roteiro e havia maravilhosas passagens descrevendo alguns sonhos que necessitavam de uma situação básica. Então, ele me convidou para criar uma estrutura e também acrescentar um pouco de graça. Assim, reinventei a trama, escrevi os diálogos com mais humor e devolvi para ele. Gilliam criou aquele mundo chamado ”Brazil” e não eu. Lembro-me que o avisava sempre de que George Orwell tinha feito algo parecido antes e ele respondia: ”Tudo bem, tudo bem.” Foi só depois de terminada a filmagem que Gilliam admitiu nunca ter lido 1984 e de ter se surpreendido com a semelhança com Brazil.

Em seu livro On Directing Film, o dramaturgo, roteirista e cineasta americano David Mamet afirma que ninguém, em um estúdio de filmagem, sabe ler um roteiro. O que pensa disso?
Entendo o que ele quer dizer. A leitura de um roteiro exige uma mente criativa, pois muitos desses trabalhos são difíceis de ler. Assim, espera-se uma pessoa com sensibilidade suficiente para entender as intenções. A experiência que conquistei no teatro me ensinou a ser o mais claro possível no texto, pois o pior acontece quando elenco e diretor não entendem suas pretensões. Creio que Mamet faz, ao dizer isso, uma distinção entre um ponto de vista subjetivo e outro objetivo. Nem sempre é fácil traduzir no papel o que se passa na sua imaginação. Daí a necessidade de se encontrar um meio termo que não prejudique a intenção original.

PROGRAMAÇÃO

2 DE JULHO

19 h – A Poesia Envenenada de Dom Casmurro, palestra de Roberto Schwarz
21 h – Show de abertura, com Luiz Melodia
Tenda da Matriz

3 DE JULHO

10 h – Mesa 1
Primeiro Tempo
Adriana Lunardi
Emílio Fraia
Michel Laub
Vanessa Bárbara
 
11h45 – Mesa 2
O Espelho
Elisabeth Roudinesco
15 h – Mesa 3
Retrato em Branco e Preto
Carlos Lyra
Lorenzo Mammi

17 h – Mesa 4
Conversa de Botequim
Humberto Werneck
Xico Sá

19 h – Mesa 5
Admirável Mundo Velho
Tony Judt

4 DE JULHO

10 h – Mesa 6
Formas Breves
Ingo Schulze
Modesto Carone
Rodrigo Naves

11h45 – Mesa 7
Ficções
João Gilberto Noll
Lucrecia Martel

15 h – Mesa 8
Os Fuzis
Caco Barcellos
Misha Glenny

17 h – Mesa 9
Estética do Frio
Martín Kohan
Nathan Englander
Vitor Ramil

19 h – Mesa 10
Veludo Cotelê
David Sedaris

5 DE JULHO

10 h – Mesa 11
Guerra e Paz
Chimamanda
Ngozi Adichie
Pepetela

11h45 – Mesa 12
A Mão e a Luva
Neil Gaiman
Richard Price

15 h – Mesa 13
Fábulas Italianas
Alessandro Baricco
Contardo Calligaris

17 h – Mesa 14
Paraíso Perdido
Cees Nooteboom
Fernando Vallejo

19 h – Mesa 15
Shakespeare, Utopia e Rock”n”Roll
Tom Stoppard

6 DE JULHO

10 h – Mesa 16
Os Livros Que Não Lemos
Marcelo Coelho
Pierre Bayard

11h45 – Mesa 17
Sexo, Mentiras e Videotape
Cíntia Moscovich
Inês Pedrosa
Zoe Heller

15 h – Mesa 18
Papéis Avulsos
Flora Süssekind
Luiz Fernando Carvalho
Sergio Paulo Rouanet

17 h – Mesa 19
Folha Seca
José Miguel Wisnik
Roberto DaMatta

19 h – Mesa 20
Livro de Cabeceira
Convidados da Flip lêem trechos de seus livros prediletos